segunda-feira, 22 de outubro de 2012

Eu poderia gritar, mas não sei se as pessoas da rua entenderiam o peso das palavras. Porque não são palavras bonitas, são como vômito de algo há muito tempo comido e que nunca teve a correta digestão. Vômito de um amor comido que se anseia em comer novamente, mesmo sem que ele tenha saído um dia do estômago.

Eu poderia gritar, mas certamente quem deveria ouvir não estará passando na rua nesse momento. Porque ele nunca, nunca passa nessa rua.


Mudou o caminho e isso já tem anos, mas eu teimo em reencontrar um caminho de folhas amarelas secas que cruze com o seu. Poderia ser até um caminho de pedras. 


Porque você não passa mais na minha vida, mas meu amor por você nunca passou.

quarta-feira, 3 de outubro de 2012

A vida que não se deve viver

Já é meia-noite, mas isso (também) é uma mentira. O relógio vive adiantado desse tempo que é pra ver se o tempo passar mais rápido e com ele vem o sossego. Mas talvez essa técnica esteja funcionando muito mal e seja uma boa hora para conseguir uma nova. Uma que não inclua a falsa ilusão de manipulação temporal, uma que traga um sossego inexistente consigo.

Percebi que os últimos anos têm sido uma mentira. E talvez a vida inteira tenha sido. Acordei um dia e já tinham se passado vinte e seis primaveras, entretanto, não estava vivendo a minha vida em boa parte delas. Passei a vida vivendo a vida dos outros. Resolvendo o problema dos outros. Levando a culpa por coisas que eu nunca fiz, mentindo e ocultando informações para evitar brigas, mas elas sempre vinham não se importando com o tamanho do meu esforço.

Desde sempre fiz de tudo para manter a boa convivência, passando dias e mais dias tensa enquanto vivia só para tentar manter uma paz que as pessoas teimavam em quebrar. Insistente como sou - talvez demais - mantive a técnica falha de assumir os erros dos outros, de convencer um e outro que não tinham um problema, que estava tudo bem, que a vida era um lindo comercial de margarina. Mas as brigas sempre voltavam rindo dos meus esforços vãos e de tão vãos que eram, até eu sabia que não adiantariam de nada.

Mas o que mais poderia fazer a não ser evitar? Muitas coisas, hoje eu vejo. Eu era fraca demais e muitas vezes recebi (e ainda recebo) acusações falsas de que defendo um lado, de que tenho favoritos, de que não amo um ou outro. E pobre do meu coração, sangrava a cada uma dessas palavras. Justo ele que tinha o espaço de cada um milimetricamente do mesmo tamanho guardado. Justo ele que fazia o cérebro mandar sinapses de medo e submissão para o corpo para que as coisas ficassem bem, justo ele que só agia para ver todos felizes.

E sangrava, e quebrava e colava de novo. Meio mal posicionado, mas colava. Ainda funcionava: do mesmo jeito bobo. Entretanto cortes um dia ficam tão profundos que não há mais como colar perfeitamente, nem costurar, nem nada e as coisas vão mudando. Depois de tantas acusações indevidas, de tantas dores sentidas pelos outros, de uma vida não vivida, do medo da briga iminente, do sorriso amarelo, do choro escondido, da atuação de pessoa feliz para uma sociedade que tão pouco ligava pra isso; resolve-se mudar o jogo para ver se agora funciona. E isso, nem é por maldade.

É o coração, que mesmo bobo, prefere agora se afastar. São os ouvidos que de tanto aguentarem gritos sem deixar a boca falar, já cansados, agora não ligam mais para que a boca descontrole-se em gritos e palavras que nunca foram ditas. É a sensação de fracasso de ter feito tudo do melhor sempre e ainda assim, não ter conseguido modificar nada. É o desespero que já deixou de desesperar e agora vira indiferença e inércia.

Porém, o coração ainda sente e ainda tem aquele velho sonho idiota de ver todos felizes. Mas já não tem tanta força para cumpri-lo. Ainda há a dor terrível de ver duas pequenas pessoas amadurecendo como eu amadureci. Meio solitárias, meio amargas, meio sem esperança. Rodeados de brigas e onde um momento feliz sempre tem o coração batendo meio amedrontado porque sabe que logo as lágrimas voltam. Mas sorte seja, eles passaram por esse processo de indiferença antes de mim e sofrerão menos ou fingirão mais.

Eu cansei do meu papel. O papel que desempenho no filme da minha vida é secundário, pois sempre estive fazendo um papel principal na vida dos outros. E agora, dando-se conta de que o tempo passou e de que não vivi, notando que a situação se repete em loop infinito, é hora de despedir o roteirista e o diretor. É hora de escrever a vida. A minha vida, onde as participações especiais são dos outros e não minhas.

quinta-feira, 27 de setembro de 2012

Não era assim que deveria ser. Tudo está errado e fora de seu lugar. Nada faz sentido além daquela velha dor e das velhas lágrimas que correm sem controle.

Por lógica, uma grande dor gerada por um problema repetido deveria ficar menor a cada vez que reaparece.  Entretanto, cada vez que volta parece doer mais, a ponto de se tornar insuportável e de todo o corpo ficar em estado de letargia.

Talvez porque a esperança de que o problema seja resolvido há tempos já deixou de existir, talvez porque ser forte também cansa e a fraqueza emocional é doença crônica que só piora porque não tem tratamento, talvez porque quanto mais o tempo passa e o problema se repete, mais fica a sensação de incapacidade diante dele e a única sensação pensada depois de muito tempo é de simplesmente não resolver o problema.

A força aqui esqueceu que existia, mas isso não é tão ruim. Já aconteceu outras vezes e ela sempre voltou, provavelmente por necessidade e dever. Mas agora, o cansaço emocional é tão grande, a desesperança é tão viva que já não sei mais se quero que a força volte.

quinta-feira, 13 de setembro de 2012

A noite finalmente dá sinais de que o ar volta a correr. Os sentidos aguçam-se a fim de captar uma leve brisa - que seria imperceptível, não fosse pelo calor insuportável do dia. Os pensamentos finalmente parecem se organizar e os sentidos lampejam pela volta das sensações mais simples.

E de primeiro pensamento vem a solidão. Mas a minha solidão não sabe ser só: sempre tem companhia de algumas letras que florescem adiantando a primavera já esperada. Solidão a gente tem que aprender a apreciar e isso requer tempo e sensibilidade. Depois de aprender a apreciá-la é que vem a certeza - quase cruel - de descobrir que no final solidão não existe. Sempre haverá uma brisa, um pássaro, gotas d'água, um cigarro e algumas palavras de alguém pra ler. Sempre haverá uma saudade no coração e ela faz-nos companhia quando fisicamente a companhia torna-se impossível por situações amontoadas da vida.

Pra curar a doce solidão, ainda existe a inspiração e a imaginação e com elas eu posso ir onde quiser.
Conto estórias como quem acredita nelas. Como quem as vive de fato. Conto estórias como quem sonha acordada antes de dormir. Como quem realmente entra na estória.

Por vezes, sinto-me Sônia, de Dotiéviski, em outros dias, entretanto, sinto-me Basil, o pintor de Oscar Wilde. Ou talvez, seja Alice de Carroll. 

Mas a verdade é que no final de tudo, as estórias são sobre duas meninas: Adorela e Danieli. Uma que é sonho, outra que é realidade.

terça-feira, 28 de agosto de 2012


Fazer brotar sorrisos ali não era difícil. Bastava plantar ipês coloridos, céu azul, chuvas barulhentas, desejos quentes, manhãs frias e poesias sinceras em qualquer terra fértil de imaginação.

sexta-feira, 3 de agosto de 2012

Ensaio sobre a felicidade

Uma vez (e isso já tem muito tempo, tanto que a memória já apagou) me pediram o que era felicidade e mais, essa pessoa me pediu que fizesse um texto falando sobre isso. Tenho vários rascunhos desse texto, muitos deles já até se perderam em folhas soltas pelo vento ou computadores que resolvem parar de viver, e nunca consegui terminá-lo.

Cheguei a pensar que era um caso de tristeza crônica própria de escritores meio melosos. Pensei que não sabia ou conhecia a felicidade. Pensei que a felicidade não existia. Pensei em procurar um remédio para ver se a felicidade aparecia sinteticamente. Mas não, não era nada disso. O tema apenas não estava pronto para ser descrito. A ideia, latente, precisava amadurecer, criar raiz, tomar forma e conteúdo para depois virar um texto.

Acredito - e por favor, não me peçam motivos - que agora é a hora de escrever sobre felicidade. Ela já é bem grandinha dentro de mim e merece o exterior.

Para começar, não acredito em felizes para sempre. Não aqui, não agora, não neste mundo. Não do jeito como os filmes da Dinsey e comédias românticas acreditam em felizes para sempre.  Tolice demais - e uma tamanha responsabilidade quase maldosa para a pessoa - jogar toda a sorte da felicidade em uma pessoa. Um amor, no caso. Deve ser por isso que as pessoas se decepcionam tanto quando um amor não dá certo. Mas isso é tema para outro ensaio, concentremo-nos na felicidade.

Acredito que um dia o felizes para sempre vem, mas não sei quando, nem como. Mas haverá um dia em que a felicidade será plena e não dividida em pequenos momentos de felicidade (acabei de definir a minha felicidade, então?).

Quase isso. Sim, acredito que existam momentos felizes e pessoas felizes. Tem pessoas que já nasceram amargas, outras nasceram triste e algumas, nasceram felizes. Essas últimas parecem não se doer com as coisas que dilaceram os corações alheios, parece que choram lágrimas menos chorosas e que tem um coração de pedra. Antes que pensem que agora eu vou dizer que essa sou eu, já aviso que estão drasticamente enganados. Não sou nenhum dos três tipos em essência, nasci pra sentir tudo com grandeza: as maiores dores, as maiores tristezas, o maior amargor, as maiores felicidades.

E sendo uma pessoa que tem momentos de felicidade, nada mais justo que explicar a felicidade explicando esses momentos. A gente procura a felicidade demais em coisas grandes. Mas é exatamente nas pequenas coisas que ela se encontra, ao menos, é assim que eu sinto a minha felicidade.

Felicidade é o nascer do sol em um dia bonito, maior será ela se tivermos uma boa e agradável companhia nesse momento (mesmo que a companhia se traduza apenas num pensamento ou num resto de sonho da noite escorrendo os dedos). Felicidade é acordar com o sorriso de alguém que nos faz bem. Felicidade é ler poesias com o coração. Felicidade é saber que somos importantes para algumas pessoas. Felicidade é ter e-mail bonito pra ler na caixa de entrada (no meio de um monte de problemas). Felicidade é uma joaninha delicadamente sentar no nosso ombro quando estamos desatentos com as coisas bonitas. Felicidade é uma tarde chuvosa e a sabedoria de apreciar pingos na janela e nos cabelos. Felicidade é a simpatia dos desconhecidos na rua que despretensiosamente cumprimentamos ao cruzar nosso caminho. Felicidade é abraço apertado e cheio de carinho, desses que confortam e acabam com todos os problemas em um instante. Felicidade é andar no vento, sem medo de que os cabelos fiquem bagunçados. Felicidade é um campo de girassóis amarelos e doces como só eles sabem ser. Felicidade é colher fruta no pé e comer ali mesmo sem medo de bactérias. Felicidade é andar descalço na terra. Felicidade é ouvir música no último volume e errar a letra sem medo do que os outros vão pensar. Felicidade é chorar com sinceridade, de dor ou de alegria, sem se achar velho demais pra isso. Felicidade é um ipê florido e a sensibilidade de parar para observá-lo sem medo de ser atropelado. Felicidade é ver alguém querido dormir e cuidar para que seus sonhos sejam bons. Felicidade é ter família e passar horas de bobeira com ela e amá-la com o amor mais puro que tem no coração. Felicidade é beijo roubado quando o desejo já extrapola os sentidos. Felicidade é o cheiro de café de manhã ou de pitangas depois da chuva ou ainda daquele perfume que aquela pessoa usa. Felicidade é sentir a respiração de alguém bem perto, quase sufocando os sentidos. Felicidade é uma tarde preguiçosa na companhia de livros e canções. Felicidade é banho morno antes de dormir. Felicidade é saber da existência de pessoas especiais. Felicidade é lembrar e sentir tudo novamente como se fosse ontem. Felicidade são horas em que não precisamos nos preocupar em contar o tempo, apenas em viver. Felicidade é ver o sol se despedir e a lua toda encantada nascer no céu. Felicidade é contar estrelas antes de dormir. Felicidade é ter imaginação forte e viva o bastante para criar um mundo diferente. Felicidade é sonhar quando adulto, sem medo de parecer bobo. Felicidade é dizer palavras sinceras de carinho aos que nos cercam e ouvi-las (sempre!). Felicidade é receber uma ligação inesperada. Felicidade é passear no parque sem pressa. Felicidade é comer a comida preferida sem medo de engordar. Felicidade é ter alguém pra conversar sobre tudo e sobre nada. Felicidade é viver por viver, sem preocupações e dores desnecessárias.

Aos que não se sentem felizes com pequenas coisas, desejo que aprendam a gostar da simplicidade.


quarta-feira, 25 de julho de 2012

O contrário

Tem gente que está indo embora (para sempre).
Mas como deixar ir agora que já lhe apresentei
E deixei viver cada canto da casa, respirando meu ar?
Se ele falar que nunca volta, me jogo aos seus pés e imploro.
Se ele falar que volta amanhã, lhe peço que nunca mais volte.

Pra ver se o contrário funciona.

Distância

E ao ir dormir, sempre - e como sempre - faço minha oração. E sempre - de pra sempre e desde sempre - esteve em minhas orações. Porque sempre foste pessoa importante e especial e este grau de importância e especialidade sempre, sempre aumentam.

Em minhas andanças só pelo mundo, sei e tenho plena certeza, de que sempre está ao meu lado. Mesmo em distância física, está ao meu lado como estou do seu.

Porque distância é coisa que não existe pra quem sabe sentir. Distância é ilusão, é apenas a falta de calor, mas não de carinho. Distância é só a falta de cheiro real, mas que se transforma em cheiro de flores do campo ao primeiro nascer do sol. Distância é a falta de abraços que se traduz em doces palavras. Distância é uma coisa que não existe.
O dia era cinza.
Era cinza e lindo.
E tornou-se negro.
Pouco a pouco.

De negrume doeu.
Fez ela chorar.
Cessou canções.
Disse não ao amor.


sábado, 30 de junho de 2012

Do surpreendente

Teve tempo de olhar os pingos de chuva sumirem no vidro da janela depois daquela inesperada e surpreendente chuva. Via alguns escorrerem e outros, meio que se condensavam por causa do frio - que não era grande, mas também não era comum por ali.

Da falta do comum e da sobra de surpresa, ficou admirada ao perceber que há muito tempo surpresas não existiam na sua vida. Ou será que existiam e não conseguia notar?

Continuou por mais alguns instantes hipnotizada pelos pingos de chuva grudados na janela do quarto. Estava encantada com o fato da sua visão do mundo ter mudado e queria aproveitar para ver a rua de sempre através daqueles pingos de chuva. Era uma maneira de fugir dos problemas, entretanto sem muito sucesso.

Pensar que a paisagem habitual havia mudado pelos pingos de chuva mostrava que a vida dela não tinha nada de mais interessante se passando. Não que não gostasse de chuvas, céus e nuvens desde sempre, mas agora, era a novidade dos dias dela. Era a única coisa que tinha pra contar quando alguém lhe perguntava as novidades. Isso ou algo sobre o trabalho e o cotidiano já de botas batidas.

Com a mesma intensidade que desejava mudanças, sentia-se fraca para procurar meios de mudar. A apatia parecia ter tomado conta daquele seu velho corpo - que não era velho, mas sentia-se como se fosse - não deixando meios visíveis de mudar a situação. Até porque já nem sabia mais se a situação deveras a incomodava. Era indiferente. Tudo lhe era alheio e indiferente.

Tinha medos absurdos que nem seu íntimo conhecia direito. Tinha vontades irregulares que só o travesseiro dividiam com ela. Tinha sonhos de dormir e de acordar meio desconexos e por muitas vezes se viu confundindo os dois. Tinha vontade de voar, mas desconhecia em sua anatomia a presença de asas. Tinha pequenos prazeres diários para lhe arrancar sorrisos, como o querido vidro desenhado com os pingos da chuva. Tinha muitas pessoas em seu meio, porém, só dividia seu mundo com poucos - pouquíssimos -, o restante era desnecessário e difícil de se suportar fora do horário comercial.

Sentia que como os pingos congelados na janela, assim também estava o tempo naquele momento. O tempo, havia algum tempo já (talvez muito, talvez pouco, não sabia contabilizar com certeza), passava como bem entendia. Alguns minutos duravam eternidades, algumas madrugadas, segundos. E mesmo os dias parecendo curtos geralmente, não sentia os meses e só notava que já havia se passado trinta dias ao mudar a folha do calendário. Tudo isso porque a vida profissional pedia - ela e seus benditos prazos -, do contrário, ainda estaria em janeiro.

Abriu um pouco a janela e quis gritar, mas nem sabia o que gritar. Se gritasse suas dores, o mundo deveria gargalhar dela ou dizer que suas dores são maiores. Se gritasse coisas de baixo calão, a veriam como uma mal educada grosseira e revoltada sem motivos. Se gritasse um poema, ninguém iria entender. Se apenas gritasse... se apenas gritasse... pensou nisso e chegou a conclusão de que talvez não soubesse apenas gritar.

Era indiferente demais pra gritar, era indiferente demais para dividir alguma coisa com aquela gente que ela vagamente via passar na rua por vezes infinitas. Era indiferente demais para aqueles pingos de chuva. Era indiferente demais para sentir.



segunda-feira, 11 de junho de 2012

As pessoas que eu gosto

Eu sou do tipo de pessoa que gosta de pessoas bonitas por dentro. Pessoas de alma radiante, leve e cheia de coisas bonitas pra contar. Mas é claro, que a beleza externa também me encanta.

Gosto de pessoas de nariz bem desenhado. É uma paixão antiga, sempre será. Não é a toa eu me recordar mais do nariz de uma pessoa do que de qualquer outra coisa em seu rosto/corpo. Perco-me por horas admirando um belo nariz. E esses narizes bem desenhados são ainda mais belos e encantadores quando sabem gostar de cheiro de flores do campo, livros velhos, de chuva e do meu cabelo.

Tenho encanto por mãos. Com dedos longos e finos. Ou nem tão finos. Ou nem tão longos. Mas que especialmente, além de bonitas, saibam fazer carinho no cabelo, cócegas na barriga, arrancar suspiros e sorrisos.

Gosto de pés. Pés branquinhos, limpos e doces. Pés que sabem aonde ir e onde chegar. Pés que sabem caminhar até você, em alguns momentos com toda doçura do mundo e em outros, com todo o calor que há na Terra.

Gosto de cabelos lisos e não lisos, desses bons de passar a mão. De pessoas que não tem medo que a gente desarrume o seu cabelo enquanto brinca de fazer carinho ou de bagunçar. Cabelos que deixam cheiros gostosos e de saudade no travesseiro da gente.

Gosto de bocas e das palavras que elas podem falar. Palavras pra fazer a gente rir, pra fazer a gente gargalhar, pensar, perder o fôlego, esquecer do mundo. Bocas que saibam que a beleza maior delas não está no seu desenho ou na sua cor, mas sim no que elas podem dizer pra gente em todos os momentos.

Gosto de dentes e do sorriso sincero que eles sabem mostrar pra gente. Pessoas que mostram dentes quando a gente tá triste, quando a gente conta uma piada - por mais sem graça que seja -, quando a gente fala algo bobo, quando a gente fala algo bonito, quando olham pra gente. Pessoas que sabem sorrir com a alma.

Gosto de pessoas com olhos bonitos que olham pra gente com a leveza da bossa nova, a malandragem do samba, o quente do rock´n´roll, a doçura da música clássica. Olhos que olham pra gente de verdade.  Que nos fazem ficar de bochechas vermelhas de tão profundo que nos penetram. Olhos que entendem a gente, só de olhar pros nossos.

Gosto de gente com cheiro, com cor, com tato, com poesia, com música, com leveza, com alegria, com amor. Gosto de gente que tenha jeito de gente e que eu, chamo de minha gente.


quinta-feira, 7 de junho de 2012

De como o tempo passa

Olhei o calendário e rapidamente várias sensações estranhas invadiram o meu corpo vindas de duas constatações: o ano (novamente) chegou em sua metade e o meu vigésimo sexto aniversário se aproxima a passos largos.

Lembrei de como a chegada dos aniversários era encantadora quando criança. Brigadeiro, bolo, presente, abraços, festa, comemoração, guaraná, balão. A proximidade dos sonhos realizados quando adolescente: faculdade, casamento, filhos, vida de adulta. E agora? Que sensações trazem a proximidade de mais um aniversário?

É tudo estranho após me dar conta de que o tempo tem passado, a vida tem passado, mas parece que não ando vivendo. Talvez por tudo passar rápido demais. O mundo gira muito rápido e eu, lenta em minhas assimilações, vivo com a sensação de ressaca provocada por essas voltas malucas e rápidas do planeta. E claro, corre sangue nas veias, eu estou vivendo.

Vivendo? Não seria isso a sobrevivência? Acordar cedo, trabalhar, receber, pagar as contas, ler, ver filme, família, amigos, bar, acordar cedo, trabalhar, receber, pagar as contas... Um loop infinito de coisas que se repetem sequencialmente. Um loop que parece não deixar brechas para fugas, nem para mudanças. Vida de adulto é assim, então? Será que não tem tanto brilho mesmo ou aos olhos de criança/adolescentes as coisas sempre têm mais brilho?

São muitas perguntas e quanto mais procuro respostas, mais perguntas aparecem. Não, isso não é uma reclamação formal da vida de adulta e do fato do tempo passar rápido demais - até porquê, talvez seja eu que me deixe passar -, isso é só uma sensação que apareceu aqui e que, dividindo, que fico mais leve.

sábado, 2 de junho de 2012

Coração depedaça(n)do

Ela sentiu o coração despedaçar, cada pedaço caia ao chão seco de tristeza. Sentiu a voz ficando fina e falha. Não queria chorar, não queria mais chorar pelo mesmo motivo, não queria mais ter esse motivo, não queria mais ter coração. Mas as lágrimas escorriam-lhe o rosto sem que ela pudesse evitar. Quentes, queimavam os olhos, bochechas e pescoço. Acabavam de queimar o resto de coração que se despedaçava em velocidade ainda maior agora.

Sentiu o ar ficando falho e, não fossem as pessoas que ainda eram importantes e moravam naquele coração em frangalhos, teria desejado não mais respirar. Porém, não era tão covarde assim a esse ponto. Não queria fugir de nada e ao mesmo tempo queria fugir de tudo.

Sonhava com aquele velho mundo bonito no qual sempre se escondia, só que dessa vez, parecia que as portas estavam fechadas. Tinha que ter sonho e coração para entrar no mundo encantado e nesse momento, seu coração estava ao seus pés e os sonhos tinham todos morrido por falta de cor.

Secou as lágrimas, esboçou um sorriso. Não conseguiu. Tamanha falsidade não era de seu feitio. Procurou distração em vão. Pensou em dormir, não conseguiu. Quis gritar, não tinha voz nenhuma. Quis conforto, não tinha.

Lembrou que tinha que continuar vivendo. Seca ou não. Dolorida ou não. Sem sorriso ou com. A vida ainda estava ali na sua frente e os seus queridos, ainda precisavam de tudo que agora não tinha. Precisava ser forte, precisava ser alegra, precisava rápido.

quinta-feira, 24 de maio de 2012

Do aperto

É um aperto que não se sabe a origem, tampouco se tem fim próximo.

É um desses apertos de tirar a respiração, a paz, o sossego. De manter o corpo todo trêmulo e febril por dias inteiros, de deixar o cérebro pronto para o pior - mesmo sem saber se o pior deveras vem.

É um incômodo tão grande esse que o aperto gera, que tendo céu azul deseja-se cinza - pois o azul é alegre demais. Mas tendo céu cinza, deseja-se o azul de volta - porque o cinza causa tristeza ainda maior.

E não é um triste convencional. É um triste sem motivos, um triste irritado, um triste que está cego e não vê mais esperanças em nada e para nada.

Além de tudo, o aperto ainda causa culpa, pois, não tendo explicação, não deveria existir. Porém, existindo, deixa a impressão de que sua causa é a falta de fé.

terça-feira, 27 de março de 2012

O mundo (ir)real

Da sacada, ela sentia o vento gelado em sua alma. Admirava a beleza do negrume da noite e das estrelas brilhantes que ela viu, pretensiosa, nascerem. Eram belas e brilhavam ao longe, brilhavam numa terra distante que ela agora sonhava conhecer.

Da mesma sacada, também via as ruas vazias. Vazias como alguns corações, vazias como o dia que não tem bom dia, vazias como os sonhos que alguém deixou de sonhar porque já não tinha tempo, vazias como um jardim que não floresce nas primaveras. Olhando aquele vazio, a menina pensava – e seu pensamento conseguia chegar perto da lua – em onde as pessoas que deveriam estar naquelas ruas estavam.

Seriam pessoas felizes? Alienavam-se frente à televisão? Cantavam? Falavam com alguém? Tinham desejos obscuros? Amavam alguém? Tiravam a vida de alguém? Idolatravam ídolos vãos? Sentavam-se a mesa? Onde estavam todas as pessoas normais daquele mundo real?

E por não encontrar, nem as respostas nem as pessoas, deixou para lá a rua das pessoas e pensou na rua de um mundo distante, para além das estrelas.

Lá as ruas não seriam tão escuras, frias e sem vida. Não! Lá havia uma bela lâmpada antiga em cada esquina cercada de lindas roseiras com cheiro tão delicioso que acompanhavam o nariz da gente até casa e tão coloridas que pintavam um sorriso na boca de todos os transeuntes.
A rua não tinha um enegrecido e esburacado asfalto, tinha ladrilhos que brilhavam a luz da noite e mostravam-se multicoloridos à medida que a luz lhes acompanhava ou não. Os canteiros centrais tinham bancos tão confortáveis, onde descontraídas pessoas conversavam sem medo da noite e casais amavam-se sem segredos. As casas da rua eram sorridentes e gentis com os que as cumprimentavam. De todas as cores, as casas iam lado a lado com seus jardins de primavera e árvores com frutas deliciosas.

O céu tinha as cores de quem o olhava! Era laranja, cor-de-rosa, azul, negro. Com tons tão belos e leves. E as nuvens, ah, as nuvens! Estas tinham tantos desenhos que até mesmo a mente com menos imaginação ali podia descobrir desenhos. O sol escondia-se sem ciúme da lua e a lua sentia saudade do sol todas as noites.

As pessoas sorriam sem amarelar, conversavam sem mentir, amavam sem fingir, cantavam sem se envergonhar, andavam sem pressa, cumprimentavam por vontade, agiam por natureza, eram doces por natureza, eram leves por instinto, eram todas diferentes e aceitavam e admiravam todas as diferenças entre elas, as pessoas falavam de sonhos, de amor, de campos de girassóis amarelos, daquela bela canção, de um filme de chorar, de uma vida que era vivida com dedicação.

As dores não cabiam naquele lugar. O sangue ali só corria dentro das veias, artérias e corações. A tristeza era só poesia. Lágrimas sempre tinham a beleza que os “reais” esqueciam-se de ver. Canções eram provas de amor a algo ou alguém. Textos tinham porquê de ser e a alma do autor em cada letra. Não havia brigas, não havia discussões que não levassem ao crescimento, não havia trabalho sem dedicação, não havia nada sem sentido, não havia beleza sem cor, nem cheiros sem vida.

Ali tudo era permitido e não havia desrespeito pela liberdade concedida. Alguns poderiam dizer que era o paraíso, mas ela sabia que não, era apenas o universo de seus sonhos. Um universo distante, que de tanto ela acreditar, existia realmente.

O tempo passou, o sono chegou junto com as horas e a menina tinha que se despedir do seu mundo. Mas ela não fez. Disse adeus ao mundo real e continuou com o sorriso sincero de quem vive em um mundo encantado. O mundo dela agora era irreal aos olhos dos outros, mas para ela, aquele universo surreal era o seu mundo. Até porque as cores do mundo real não combinavam com aquela menina de sonhos.

quinta-feira, 8 de março de 2012

Mulher-bicho estranho

Mulher é mesmo um bicho estranho. Digo isso sendo uma - quer maior mérito que este? -, mas para os que ainda duvidam da teoria, explicarei tudo.

Mulher tem sempre aquela doçura no jeito de falar, aquela doçura que consegue tudo que quer, consegue o mundo, consegue carinho, consegue oportunidades, consegue arrancar sorrisos, suspiros, roupas. Doce como aquela barra de chocolate gigante que ela devora sozinha no quarto naqueles dias em que é melhor se manter à uma distância segura de toda e qualquer mulher do mundo. Mas não sei o que acontece às vezes que toda a doçura da mulher vai embora e fica um amargo, mas não é um amargo como homem fica amargo, é diferente. É um mau humor amargo que ainda consegue tudo. Deve ser mágica ou alguma coisa sobrenatural. Mas vocês tem de concordar, até mesmo amargas, mulheres ainda são doces.

Mulher tem aquelas curvas, aquele traçado todo fino e diferenciado. Como se fosse uma obra melhor lapidada que o homem. É tudo suave naquelas linhas. Suave e encantadora. Em todas as mulheres. Nas magrinhas, nas gordinhas, nas malhadas, nas que tem muito em cima, das que tem muito embaixo, das que tem muito, das que tem pouco. É sempre um encanto, é sempre algo bonito de olhar. Os homens de plantão sabem dizer melhor que nós - que temos eterna mania de só nos acharmos bela em super produções - que mulheres são lindas quando acordam. Lindas. Cara de sono, camiseta velha, sem maquiagem, sem salto alto, mas ainda assim com a mesma suavidade e beleza. É, mulher realmente é um bicho estranho.

Mulheres aguenta dores profundas com tamanha facilidade, mas inutilmente sofre ao tentar abrir um vidro de conserva. É um paradoxo força/fraqueza tão grande, que às vezes parece que a gente só tem fraqueza em situações cotidianas pros homens nos protegerem sempre. Porque uma coisa é fato: a gente pode ser independente o quanto for, mas sempre vai gostar de proteção e mimos.

Mulher consegue igualmente discutir política, antropologia, física quântica e logo em seguida ter uma crise histérica de não pensar mais em nada em frente à uma loja de sapatos em promoção. Vocês homens nunca entenderão isso. Mas poxa, do que eu estou falando se nem eu entendo isso? Mulheres conseguem ter um equilíbrio desconhecido entre a inteligência e a futilidade extrema. Entre as bobeiras e as conversas sérias. Entre rir sincero e convencional.

Mulher tem aquele sorriso bonito, aquele olhar lindo, aquelas mãozinhas delicadas, aquela capacidade de ser muitas, aquele dom de ser mãe, aquela leveza de ser amiga, aquele encanto de ser pessoa. Mulher é poesia, sendo poetisa ou inspiração, mulher é bailarina nata mesmo levantando da cama, mulher é prosa falando da vida, mulher é conto sempre bonito, mulher é quente como noites ofegantes, mulher é bossa nova ao sorrir, mulher é criança ao fazer dengo, mulher leva o melhor perfume do mundo em seus cabelos naturalmente, mulher é alegria da vida dos outros, mulher é o bicho estranho mais encantador do mundo.

terça-feira, 6 de março de 2012

Rotina

Ela chegou. Olhou-se demoradamente no espelho. Sorria. As bochechas rosadas pela maquiagem (não havia motivos para timidez). Estava só. Despiu-se com delicadeza e demora. Primeiro os anéis, um a um foram colocados sobre a mesinha. Depois o relógio - ela não queria mais contar o tempo. A blusa escorreu pelos braços e ficou aos seus pés. A saia deslizou pelos joelhos e caiu, fazendo companhia à blusa e a sapatilha. Desfez-se da pouca roupa restante e contemplou o corpo nu. Demoradamente analisou cada defeito, aquela celulite que surgirá de repente, uma gordurinha indesejada, aquela assimetria das pernas. Docemente, também analisou cada beleza, aquela pintinha charmosa no canto da barriga, aquele desenho bacana das pernas e a leveza do sorriso. Ah, era bonito aquele sorriso e combinava bem com aqueles olhos delicados.

Mas algo ainda a mantinha presa ao mundo real e ela, em necessidade de se analisar totalmente nua, retirou essa parte também. Alguns toques de algodão e lá se foi a maquiagem. E junto com a maquiagem, algo que ela gostava muito foi-se também. O sorriso sincero era só maquiagem e caiu no chão em um pedacinho de algodão.

segunda-feira, 5 de março de 2012

O vazio dos outros

Era tudo tão cheio de tantas vozes diferentes, afoitos em disputar um espaço no silêncio. Entretanto, parecia que o lugar tão cheio era tão vazio. Não porque nenhuma pessoa especial para ela estava ali, mas vazio de sonhos que nunca se realizavam e corações que nunca sabiam onde iam.

O complexo paradoxo vazio/cheio acabava por irritá-la duplamente. Primeiro porque ela não tinha mais idade para ambientes cheios. Não gostava de ouvir tantas vozes, nem de ver tantos passos sem rumo. Segundo porque não gostava do que parecia vazio. Talvez porque seu coração sempre fora tão cheio de amores, talvez por conseguir ver o vazio das almas alheias.

E seguia seu momento de incomodo sentada num canto querendo ser indiferente sem sê-lo, sentido-se tão diferente de todos e ao mesmo tempo - e era isso que lhe causava dor - tão humanamente igual a todos que a cercavam. Tinha os mesmos defeitos com ar de irreparáveis, tinha os mesmos medos bobos, tinha os mesmos momentos de tagarelice fútil, tinha os mesmos sonhos vagos.

Numa tentativa de ficar alheia a tudo, escrevia rapidamente num bloquinho de papel velho como se aquilo fosse sua salvação.E não sendo salva, concluiu num suspiro: ela também era vazia como eles.